Começo esse artigo com uma afirmação muito importante, mas pouco valorizada: São raras as mulheres que engravidam na primeira tentativa. Vida de tentante!
Pois é, está aí uma verdade que poucas pessoas parecem enxergar.
Sim, pessoas… pois não são apenas as mulheres que esperam engravidar “num passe de mágica”, mas a maioria das pessoas ao seu redor. Apesar de ser uma visão compartilhada, a cobrança por gerar uma vida é direcionada com mais frequência à mulher.
O que costuma aparecer em forma de comentários como: “Há quanto tempo vocês estão casados? E ainda não engravidou?” “Quantos anos você tem? Na sua idade eu já estava no terceiro” e etc…
Tudo bem, acredito que a maioria das pessoas dizem essas coisas na tentativa de incentivar e tentar entender o fato de você não ter engravidado ainda (ou não ter partido para o próximo), mas o que essas pessoas não percebem é que o tiro sai pela culatra e, ao invés de incentivar, acaba gerando sentimentos e emoções negativas (que também podem ser do parceiro, mas é na mulher que eles se encontram mais intensamente, afinal, é no corpo dela que tudo acontece).
De acordo com VALADARES et. al (2006) as mulheres são mais propensas a possuírem depressão e desordens cognitivas, leva-se em conta os sentimentos vivenciados, diferentes do gênero masculino.
Dentre os sentimentos e emoções mais comuns destaco tristeza, questionamento, expectativa, sentimento de fracasso, sintomas depressivos e os mais intensos… ansiedade e culpa.
Por trás destes sentimentos temos a sociedade capitalista que demanda de todos os seus sujeitos o fato de, diariamente produzir capital e principalmente a missão que acorda junto com todos nós, aquela de fazer a diferença no mundo. E por estar dentro de tais padrões, haverá vezes que há sofrimento por parte de uma mulher que possui desejo de simplesmente não produzir, não ter filhos, dedicar-se a sua carreira, por exemplo.
Intitulação de papéis é algo que pode gerar muito sofrimento no ser humano, afinal para a sociedade; a sua vida, possui começo, meio e fim, é designado que você deve crescer ter/criar filhos e assim, e por fim, ter o direito de padecer.
Por isso, quando se percebe que o desejo de ser mãe é algo que se origina dentro de você e não algo que é imposto pelas pessoas ao seu redor, pode resultar em problemas, quando a tentativa de engravidar começa a levar um tempo maior do que o esperado e aí a ansiedade e a culpa passam a ter proporções cada vez mais altas… Pois além de prejudicar a saúde mental e emocional, seu prejuízo é levado ao físico também.
O que acontece, é que quando a ansiedade e a culpa são muito elevadas, podem tornar o processo para engravidar, ainda mais difícil. Levando a demorar ainda mais e levando a mais ansiedade culpa… tornando tudo uma bola de neve.
Explico:
Isso acontece porque sua ansiedade e culpa lhe trazem sofrimento. Então, o cérebro entende que se você engravidar, você poderá ter ainda mais ansiedade e culpa, sofrendo ainda mais. E “bloqueia” a sua capacidade de engravidar, mesmo que seu corpo esteja apto a isso. Contraditório não é?
Temos aqui então, dois pontos:
- O cérebro tem capacidade de “mexer” com o nosso organismo em todos os níveis.
- O cérebro nem sempre é tão inteligente assim (risos). Ele precisa ser ensinado a lidar com as emoções para que ele aja da maneira esperada. Nós não nascemos sabendo a fazer isso, é algo aprendido e uma das formas de aprender é na psicoterapia.
Ainda discutindo sobre este complexo corpo feminino, estudos mostram que até 80% das mulheres sofrem algum tipo de sintomas físicos e/ou psíquicos no seu período pré-menstrual. Tais sintomas acontecem na semana que antecede a menstruação, e se cessará dias após seu inicio.
As mulheres possuem sofrimentos distintos, principalmente na idade reprodutiva e com problemas menstruais, tal período é propicio para disfunções psíquicas já que sua alteração hormonal é comprovada, podendo aumentar comportamentos depressivos ou/e obsessivos, por exemplo.
Pensar em tais questões quando a mulher está gestante ou em uma grande batalha para engravidar, perceber que tais sintomas pré-menstruais são nítidos e caem por terra, pode-se concluir que além da diminuição de hormônios, como a serotonina – que proporciona a sensação de bem-estar – esta mulher ainda sofrerá a decepção de não conseguir ‘manter-se’ reprodutiva para criar condições em realizar seu sonho em ser mãe.
A relação de amor versus ódio é vista por muitas pessoas, seja um público que não está programando uma gravidez, quanto àqueles casais tentantes.
Independente de campanhas de conscientização sobre o uso de preservativo, muitos parceiros não usam a camisinha, o que poderá resultar em uma gravidez indesejada – e então, destaca-se a relação de amor e alivio que é criada pelo casal, já que esta parceira que realizou sexo sem prevenção, acaba menstruando, lhe trazendo sentimentos de conforto, pois não fazia parte de seus planos uma gravidez indesejada.
Percebe-se exatamente a relação contrária que isso pode trazer, com casais tentantes para conceber um filho e a parceira percebe suas questões hormonais diferenciadas, mas não tanto ao ponto de achar que teria sua identidade mudada, maternalmente falando, onde seu período fértil deixa de existir, pois os sintomas da tensão pré-menstrual apareceram, acarretando sentimentos de ódio por tal fato.
Por conta desse turbilhão de sentimentos e emoções, a tentativa de engravidar pode tomar um espaço muito grande na vida da mulher tentante. É necessário ficar atenta para não acabar “abandonando” as outras áreas da vida.
Parece algo óbvio, mas é o que muitas vezes acontece!
É necessário manter as outras áreas da vida funcionando para ajudar a preservar a saúde mental, emocional e física. Auxiliando a amenizar os sentimentos e emoções que falamos a cima e, por consequência, ajudando a diminuir as chances de o seu cérebro te sabotar.
Uma das outras áreas da vida, que costuma ser bastante afetada nesses casos, é a amorosa. Isso mesmo, parece estranho pensar nisso, mas acontece muito pelo fato do casal passar a combinar os dias em que terão relação sexual para aumentar as chances de gravidez.
Porém, quando isso acontece, o casal pode acabar perdendo “o clima” e sintonia, levando a diminuir o desejo sexual um pelo outro.
Afinal, o sexo com data e hora marcada nem sempre tem seu charme não é mesmo? Pois um pode não estar muito a fim, outro pode estar cansado… transformando esse momento do casal em algo mecânico e monótono.
Além disso, outro ponto que faz a relação ficar cada vez mais desgastada é quando uma das partes, ou os dois, começam a procurar um culpado para o insucesso da gravidez. Não é raro que um dos cônjuges comece a culpar o outro e isso deixa a convivência mais difícil. O que precisa ser pensado aqui, é que o casal precisa estar junto nesse momento e não um contra o outro. Ou seja, enfrentarem os exames, os resultados dos exames e as tentativas um ao lado do outro, compartilhando as frustrações para que o peso disso tudo fique mais leve para ambos.
“Peso compartilhado, é melhor suportado!”
Outra área da vida que costuma ser bastante afetada é a social. Pois a mulher pode acabar se afastando das amigas e familiares que estão grávidas ou já tiveram seus filhos.
Por querer evitar ficar olhando o que a outra tem e que tanto se deseja e/ou para evitar ficar escutando aqueles comentários desnecessários e inoportunos. O contraponto disso é o isolamento em que a tentante pode se encontrar. Podendo fortalecer os sentimentos e emoções ruins, como os sintomas depressivos.
Afinal, essa espera é a espera do não ter respostas, do não saber o que vai acontecer, do escancarar o quanto somos limitados… é a espera de ter que adiar o desejo.
Espera frustrante vivida por casais tentantes… tentantes de uma nova família, de uma nova fase, de uma nova vida, de uma nova história!
Produzi este texto “Vida de Tentante” com parceria da Psicóloga Silvana Bernardo (psicologa@silvanabernardo.com.br) (CRP: 06/124413), idealizadora do TPM: Terapia Para Mulheres.
Você pode conhecer o trabalho dela pelo site: www.silvanabernardo.com.br , e acompanhá-la pelas redes sociais! Facebook: Psicóloga Silvana Bernardo.
Referências:
VALADARES, Gislene C. et al. Transtorno disfórico pré-menstrual revisão–conceito, história, epidemiologia e etiologia. Rev Psiq Clín, v. 33, n. 3, p. 117-123, 2006.
Assista abaixo a LIVE que as autoras do texto fizeram sobre o tema Vida de Tentante:
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